Alejandro Zambra – Formas de Voltar para Casa (Formas de volver a casa)

formas de volver a casaToda semana tem post, todo mês tem vídeo, todo ano tem Zambra! Vamos a um post curto nessa semana porque, sei lá, porque sim. Aliás, vocês reparam quando um post é mais curto do que o outro se eu não avisar? Acho que não, né? Não vou mais falar nada sobre esse assunto.

Vamos falar do livro do Zambra, que comprei numa promoção da Cosac, porque promoção da Cosac é igual meia-entrada em show: Tem toda hora, todo mundo pode, e quem não aproveita claramente tem problemas. Peguei o livro e o livro pegou uma chuva desgraçada num compartimento da minha mochila em que tinha esquecido o setlist de um show que a minha banda fez de modo que a tinta do pincel atômico do papel se diluiu na água e manchou meu exemplar inteiro, que por si só já estaria bastante arruinado só pelo toró. Mas a estante é feita de livros ferrados também, então vamos aguentar que nem homem e falar direto do conteúdo, que é o que importa, muito embora alguns blog se vlogs no youtube estejam tentando te fazer pensar o contrário.

Minha história com a literatura do chileno Alejandro Zambra começou, como para muitos, com Bonsai. Fiquei estupefato pela criatividade e pelo quanto o sujeito conseguiu dizer com tão poucas palavras (o livro é minúsculo). De modo que quando a Cosac lançou A Vida Privada das Árvores (que também fala de plantinha no título), resolvi adquirir num escambo maroto no Skoob. Li e achei muito fraco em comparação ao outro, mas mesmo assim resolvi pegar esse Formas de Voltar pra Casa porque Zambra tem a vantagem de escrever livros extremamente curtos, o que facilita uma segunda ou terceira chance caso você não tenha gostado de um dos livros dele (tente ter essa benevolência com o Thomas Pynchon). E gostei disso, porque Formas de Voltar Pra Casa é melhor que A Vida Privada das Árvores, mas menos melhor que Bonsai.

O romance parte de um terremoto que aconteceu em 1985 em Maipú, quando o narrador, que também é escritor, era uma criança de nove anos e se aproxima de uma menina chamada Claudia, que lhe incumbe a estranha missão de vigiar seu estranho tio Raúl, sem saber exatamente o porquê. A história então dá saltos no tempo e mostra o narrador em meio a uma vida amorosa conturbada, em meio ao processo de escrita do livro que estamos lendo e tentando passar em revista a história de sua infância e o relacionamento com seus pais. E entre as divisões do livro e esses elementos brotam questões: somos protagonistas de nossas próprias vidas quando somos crianças? Passamos a ser protagonistas de nossas próprias vidas em algum momento? O que é ser adulto e o que é ser criança, por que temos a necessidade de revisitar alguns episódios de muitos e muitos anos atrás e por que somos essas bolas de dúvidas? Aliás, a orelha do livro é assinada pelo Alan Pauls, e abre assim: “O que é voltar pra casa? Uma saída ou uma condenação? Esse é o dilema que dilacera esse romance triste e perfeito”. E não posso concordar com o escritor que o livro é pontuado por esse dilema, no meu entendimento ele é sobre uma coisa completamente diferente.

Alejandro ZambraÉ bem verdade que os livros do Zambra parecem dizer muito mais do que realmente dizem, muito embora a gente na maioria das vezes não saiba especificar o quê, exatamente. Mas acredito que essa volta para a casa, que se apresenta durante o romance em vários contextos e com vários significados diferentes, não pode ser resumida a uma só questão. Existem diversos motivos para se voltar para casa, inclusive para se voltar para a casa dos pais depois que a deixamos em definitivo para construirmos nossas vidas. Enquanto é criança, saber voltar para casa é uma prova de orgulho, uma demonstração de maturidade necessária para se perceber um pouco protagonista de sua própria vida; já enquanto adulto, voltar para a casa dos pais é um gesto de humildade, de tolerância e de verdade. Quando o narrador confronta o pai sobre seus ideais políticos durante o regime de Pinochet podemos ver como pode ser dolorosa a volta a casa e ao passado, e ao mesmo tempo como o gesto se faz necessário. Voltar pra casa é se redefinir.

Sobre ser protagonista na infância, o autor faz uma brincadeira com as divisões do livro. Uma delas se chama “A literatura dos pais”, quando o narrador já é adulto e percebe o quanto não tinha importância enquanto personagem quando criança, razão pela qual precisa reatar essa ponta da vida para enfim dar protagonismo a seu eu criança, e outro se chama “A literatura dos filhos”, quando ele sai de casa e começa a se tornar protagonista de sua própria literatura. A primeira parte, sobre a infância em Maipú e o terremoto, se chama “Personagens Secundários”, por essa mesma razão. E acho que com isso o que ele quer dizer é que é preciso maturidade para ser protagonista, que meramente agir, como a criança que espiona um tio de outra criança, não é o bastante. O protagonista precisa ter uma história, um background, e sem isso não é possível ter consistência. Achei legal.

Essa edição da Cosac segue o mesmo projeto dos outros livros, com capa texturada, uma cor diferente para a capa, papel pólen e fonte Arnhen, mas com uma diagramação com muito menos margem que o Bonsai, o que faz de Formas de Voltar pra Casa um dos maiores livros do Zambra publicados aqui no Brasil, com suas 157 páginas. Ah, e a tradução é do José Geraldo Couto, que é um cara massa, e tem uns poemas revisados pela Josely Vianna Baptista, que também é super competente. Essa galera, viu… só agregando valor.

Comentário Final: 157 páginas em papel pólen soft. Bate nas quiança, ensina as quiança, as quiança aprende tudo na marra…